O auxiliar de pedreiro José Luis Padilha, de 49 anos, comemora o fato de poder voltar a brincar com a neta. Depois de sofrer um AVC, o olho direito ficou comprometido e perdeu a visão. Sua córnea - a camada transparente que reveste o olho - perdeu a sensibilidade e ficou totalmente opaca, o que o impedia inclusive que ele fosse candidato a um transplante. “Era um paciente sem prognóstico de recuperar a visão”, afirma o professor do Serviço de Oftalmologia do HCPA, Sérgio Kwitko.
A visão de José só começou a voltar depois que ele passou por uma cirurgia de neurotização da córnea. O procedimento, inédito no Brasil, foi realizado em conjunto pelas equipes de Oftalmologia e Neurocirurgia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). Ele é indicado para diabéticos, para quem tem lesões por herpes ou qualquer outro motivo que cause anestesia na córnea. Só com o procedimento e a retomada da sensibilidade da região é possível realizar um transplante para recuperar a visão.
A neurotização inicia com a dissecção de um nervo periférico, retirado do braço, da perna ou até da testa do paciente. Esse nervo é dissecado no lado não afetado do rosto, e, então, passado sob a pele e “costurado” à córnea, com o objetivo de retomar a atividade nervosa do local. “São nervos da espessura de um fio de cabelo. A cirurgia dura em torno de três horas e a recuperação é tranquila”, afirma a neurocirurgiã de nervos periféricos do HCPA, Marjeane Hockmuller. Pesquisas mostram uma melhora média da visão de 41% , com pacientes mais jovens experimentando os maiores benefícios.
Desde outubro de 2024, cinco pacientes já passaram pelo procedimento no HCPA - todos pelo Sistema Único de Saúde. O retorno da sensibilidade do local pode levar de 6 meses até dois anos, mas os resultados colhidos até agora são animadores. José recuperou a sensibilidade após 6 meses e já realizou o transplante com sucesso. “Eu precisava do meu irmão pra atravessar a rua e até pra me movimentar em casa”, conta José. “Agora já consigo fazer as coisas sozinho”, comemora.